Boa leitura


Adoro o site Argumento.net. Fico triste quando não consigo acompanhar com mais frequência. E como sempre encontro pessoas muito queridas lá.
Hoje vou trazer um texto do meu amigo Paulo que ficou bárbaro!

PITAQUEIROS PROFISSIONAIS
Por Paulo Ricardo Kralik Angelini

Leio no jornal que a moda é o coaching. Para emagrecer, para fazer os adolescentes acertarem na escolha da profissão, para herdeiros de empresas que não sabem se querem de fato a responsabilidade transmitida, até para noivos que precisam ensaiar o amor verdadeiro. São casos de pessoas que pagam – caro – por profissionais que lhes servem de treinadores, motivadores. E isso me estarrece.

Não, eu não me imagino recebendo dicas e frases de incentivos de alguém para as decisões mais importantes da minha vida. Não me imagino tendo à sombra alguém pago por mim para extrair de mim aquilo que eu acho não ter condições de, sozinho, atingir. Nunca achei muito simpática a ideia dessas organizações meio militares em que há sempre a necessidade de uma voz autoritária ou motivadora para fazer o outro se movimentar. Berrar no meu ouvido me tira do sério, e o efeito tanto pode ser um grito meu do outro lado quanto minha birra – braços cruzados, não faço mais nada!

A matéria no jornal, claro, é elitista, e começa assim: Você ainda terá um coach. Imagina a dona Maria lendo isso. Coach? É aquele barulho que o sapo faz nas histórias em quadrinhos?

E penso, então, nessa dona Maria, que lê o jornal de domingo, perdido numa praça. Ela precisa pegar dois ônibus e acordar às 5h da manhã, e digamos que esteja nesta praça comendo um sanduíche que trouxera de casa, em seu intervalo de almoço. Pobre dona Maria que não tem um treinador para explicar-lhe como se sentir motivada para levar a vida que leva.

Então me dou conta. Ahá! Vai ver que é por isso que fiz publicidade antes de fazer letras. Porque não tive um coach que me orientasse e percebesse que a literatura era o meu caminho desde o início. Vai ver que é por isso que não casei ainda. Mas certamente não é por isso que não herdei nenhuma grande empresa.

E singelamente tenho a dizer para a dona Maria, essa senhora tão querida que acabei de inventar, que também nós inventamos a nossa vida, do jeito que, sim senhora, bem entendemos, desenhando sem borracha, como dizia Millor Fernandes. E não tem coach no mundo que faria eu mudar mesmo o que deu errado na minha.

E aprendo, por fim, que quem tem um coach é coachee. Só fico pensando se este ‘novo profissional do futuro’ se responsabiliza se alguma coisa der errada na vida dessas criaturas que precisam de muletas para darem os próprios passos. E mais: se eles chegam a pensar se essa tal felicidade só existe quando atingimos alguma meta. O fim é sempre mesmo o mais importante?

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